- Deonísio da Silva

Na sua opinião, qual é a importância de um evento como a Jornada Nacional de Literatura?

O principal personagem da Jornada é o público! É o evento mais importante do mundo em sua especialidade. Não há, em nenhum lugar do mundo, um encontro desta magnitude e com essas características de aproximação de autores, leitores e livros. Eu até acho que a organização deveria registrar a Jornada no Guiness, o livro dos recordes. A politização dos cidadãos do Brasil meridional deve muito às célebres Jornadas. Castro Alves resumiu bem nesses versos a tarefa: "ó bendito o que semeia/ livros, livros à mão cheia/ e manda o povo pensar". O povo brasileiro, mais do que nunca, precisa pensar. Com livros à mão. O efeito multiplicador do evento é extraordinário. Ainda que não tenham sido devidamente avaliados, sabemos que hoje há no Brasil vários eventos semelhantes que se inspiraram nas Jornadas.

Este ano teremos a 10ª edição da Jornada, das outras edições que você participou qual foi a que mais lhe chamou atenção?

A primeira, em 1981, e a mais recente, em 2001. Não só pelas efémerides, por se tratar da mais antiga e da mais nova, mas pela semente e pelo extraordinário crescimento. A primeira vez é sempre a primeira vez, tem aquele gosto de inauguração, as assombrações rondando, não sabíamos se ia dar certo, era uma coisa nova. E a de 2001, pela beleza estonteante da Jornada e de domínios conexos ao livro, com o aproveitamento de outras mídias, como o teatro e a música. Os leitores, sobretudo os mais jovens, são atraídos para o livro por uma rede muito ampla e diversificada, naturalmente centrada entre professores e alunos, nas escolas e nas universidades.

Qual é a sua opinião sobre o tema da 10ª Jornada Nacional de Literatura: " Vozes do Terceiro Milênio: A Arte da Inclusão"?

Uma generosidade impressionante e uma noção de cidadania apuradíssima. Passo Fundo, que sofre sérias exclusões, chama a atenção do Brasil para os excluídos, mas por um mirante positivo, que lembra que a inclusão passa pela Arte, não apenas por casa, comida e remédio. Casa e comida são indispensáveis. Mas casa sem biblioteca e pessoa bem alimentada, que mora bem, mas que não lê, será sempre uma desnutrida, doente, um ser humano incompleto.

Para você, como escritor e coordenador dos debates da 10ª Jornada, dos temas que serão discutidos nos Palcos de Debates quais são os de maior relevância?

Todos são muito pertinentes, muito relevantes. Eu confio mais nos conferencistas do que nos temas. E o cardápio, como sempre, tem pratos variados e saborosos. Temos o poeta e tradutor irlandês John Lyons, Doutor por Oxford e Londres, especialista em literatura hispano-americana, tradutor de Ernesto Cardenal e de Pablo Neruda, entre outros. Temos Frei Betto, o Richeliu do presidente Lula, de quem sempre digo que nasceu escritor e depois tornou-se frade. Aliás, ele é meu personagem no romance "Os Guerreiros do Campo". Dei-lhe o nome de Frei Nabor, mas ele e eu sabemos que Frei Nabor é Frei Betto. Temos Luiz Antonio de Assis Brasil, notável romancista, que faz além disso faz um trabalho eficiente na revelação e formação de novos autores. Temos a romancista portuguesa Inês Pedrosa, de quem apreciei muito o romance "Fazes-me falta". Outros destaques são escritores e escritoras que escreveram livros infanto-juvenis, que todos podem ler, mas que se destinam preferencialmente a leitores mirins. E, entre tantas atrações, a presença de escritoras como Lygia Fagundes Telles e Valesca de Assis, entre outras, mostrando que a mulher consolidou a passagem de personagem à autora em nossas letras. Há muitos motivos de celebrações e nenhum de lamentação. Pois as diversas edições das Jornadas sempre caminharam adiante, ainda quando sofreram desprezo e indiferença do poder público. A equipe liderada pela professora Tania Rösing sabe, porém, que o Barão de Itararé, notável humorista gaúcho, já dizia que "de onde menos se espera, dali mesmo é que não sai nada". Podemos dizer: de onde mais se espera, dali mesmo é que sai tudo. As Jornadas nunca decepcionaram a ninguém! A menos que demos atenção à inveja, o primeiro crime da humanidade, que resultou num genocida jamais superado por qualquer outro. Com efeito, com uma pedrada só, Caim matou 20% da Humanidade. Sempre achei que fossem 20%, mas descobri, lendo a Torá, que Caim teve uma irmã gêmea. Com quem, aliás, se casou. De modo que quem alcança o sucesso, como é o caso dos organizadores das Jornadas, deve estar preparado para isso e produzir anticorpos. Eu não queria evitar este tema, o da inveja. Pois é preciso precaver-se. Os invejosos não são tão inofensivos como querem não fazer crer. É duro trabalhar seriamente, pautado pela ética, e saber de que maldosos conspiram. Mas fazer o quê? Nada? Nada, não! Fazer o seguinte: fazer a jornada cada vez melhor. Esta é a grande defesa e o melhor antídoto. E, claro, com humildade, não achar que toda crítica pode ser descartada. A crítica bem intencionada deve ser acolhida.

26 A 29 DE AGOSTO DE 2003 - CAMPUS UPF - CIRCO DA CULTURA - PASSO FUNDO - RS - BRASIL
PATROCÍNIO
 APOIO
 PROMOÇÃO
 
©2003. Universidade de Passo Fundo - design WWW.